30.8.14

reTraTo




querido amigo meu:



/.../ sou. ando talvez um bocado fora do mundo. porque cresci "fechada". e, porém, aberta.
nasci quase na fronteira. no planalto mirandês, um lugar entre,


entre-tanto!!!:
entre também rios. o douro, esmagado nos montes e o rio sabor (sim, sa-bor!), oliveiras, gado, serras. anões. almas
vagabundas. e trigo. e serras de novo. de cores no fundo dos dias longos. dias iguais excepto nas cores. e serras de novo.
donde as trovoadas se desprendem e abrem noutras cores ainda e em mundos selvagens, únicos.
alucinantes!!!
lia torga e imaginava o que haveria para além dos muros estreitos do quintal. as luzes pra lá da fronteira, vistas da casa da
minha avó, afligiam-me e apertavam-me o peito de ânsia e assombro. ficava a olhá-las


lon-ga-men-te...
venho tacteando devagar o fio com que me puxaste. toquei, de olhos fechados, o tecido final e entrei nessa água que
corre e se inclina para os lugares que mais desconheço.
precisamente. no tempo perfeito.
mil********************************e beijos. ( de cores, as que apanhares entre a água e os olhos)
eu




/answering eu:/
legivel
said...
Estimada Eu:


Serve a presente para te informar que recebi a tua carta-com-fotografia-dentro.
Não apresentava qualquer indício de violação o que me deixou descansado. Explico. O funcionário dos correios da área, deve ter um qualquer problema visual, pois não é primeira vez que troca a correspondência que me é endereçada com a da minha vizinha Arceolinda que não é boa da cabeça. Um dia destes tocou-me à porta exibindo triunfante um envelope já aberto: "O vizinho tem aqui uma carta de um tal Francisco G. a perguntar-lhe quando é que o vizinho se digna satisfazer o pagamento de uma dívida contraida há cinco anos... ". É assustadora a mulher...
Voltando à tua carta. É deveras interessante o exercício que quase todos fazemos, de procurar desvendar um rosto, um gesto de uma mão, um sorriso desenhado na boca, um olhar carregado de emoção ou um toque de tristeza na voz, de quem nunca vimos e apenas conhecemos a palavra escrita.
Devo confessar que o teu retrato não anda muito longe daquilo que vaticinei àcerca do teu rosto...........

interrompi esta carta no momento em que me bateram à porta. Era a Arceolinda a dar-me uma novidade. Que o filho estava na NET e por puro acaso?! viu a carta que me enviaste com a tua fotografia lá dentro. Acha que tu és uma senhora muito bonita e que eu sou um vizinho com muita sorte por conhecer esta senhora que deve ter muitos estudos porque escreve coisas que ela não entende muito bem... Desejei-lhe um bom dia e fechei-lhe a porta devagarinho na cara.
Dificilmente vou terminar esta carta, sempre na expectativa da Arceolinda voltar a aparecer.

Despeço-me também com beijos pintados de cores marinhas, tal como as vi uma vez numa lata de sardinhas...

Ferdinando Z.